Da mesma maneira que a intimidade do lar não é o local mais adequado para o exercício da mediunidade, o ambiente de trabalho, a rua, dentre outros não destinados a essas práticas, também não devem ser considerados como tais. (vide questão 42)
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É sempre válido ressaltar que o melhor lugar para o atendimento aos espíritos sofredores e obsessores é o templo espírita, nas reuniões mediúnicas. Sabemos, porém, que a mediunidade não é uma faculdade que pode ser ligada ou desligada girando apenas um botão ao entrar ou sair de um centro espírita. O médium é, portanto, portador do seu mediunismo 24h por dia, seja em estado de vigília ou dormindo, dentro da casa espírita ou no ambiente de trabalho, na rua ou dentro do próprio lar...
Por ser inerente ao ser humano, a mediunidade acompanha o seu portador onde quer que ele se encontre. Isso não significa que o médium deve exercer seu mediunismo em quaisquer ambientes, de modo banal ou com propósitos fúteis, de maneira leviana ou imprudente, de forma irrefletida, sem cautela ou discrição...
Em vista disso, aqui nos limitaremos a explanar apenas alguns acontecimentos que podem surgir na vida do medianeiro, além dos riscos e inconvenientes que essas situações possam desencadear em seu dia a dia.
O MÉDIUM É SEMPRE VISADO ONDE QUER QUE SE ENCONTRE
O médium é um ser visado – onde quer que esteja – tanto pelos seres encarnados como desencarnados. Dessa forma, o medianeiro frequentemente se depara com certas insistências, na qual o bom senso, a prudência e a instrução espiritista devem lhe servir como norte.
Um dos casos mais comuns na vida do medianeiro são as perguntas dirigidas a ele por parte de pessoas encarnadas, que ao descobrirem a sua sensibilidade, passam a interrogá-lo sobre variados assuntos, desde os pedidos de comunicações para com os entes queridos, se ele nota a presença de algum obsessor próximo, dentre outras curiosidades vãs. À vista disso, o médium instruído nos ensinos de Kardec e das obras espíritas complementares, entende – pela lógica dos fatos, pela razão e o raciocínio próprio – que nem tudo o que ele enxerga, assim como as comunicações que lhe chega em cenários diversos, podem ou devem ser transmitidas aos demais.
SITUAÇÕES COMUNS NA VIDA DO MÉDIUM
Para melhor exemplificar a nossa dissertação, sem a pretensão de esgotarmos todas as ocorrências, observemos alguns eventos frequentes na vida do medianeiro:
O médium chega a um determinado evento e um Espírito aproxima-se pedindo que ele transmita um recado – aparentemente simples e inofensivo – para uma pessoa ali presente. O medianeiro sensato não compartilhará essa informação, pois compreende que tal ação pode causar um mal-estar generalizado, constrangendo não apenas o encarnado – alvo da suposta comunicação –, assim como, as demais pessoas ao seu redor. Além disso, o médium também considera a possibilidade de estar lidando com um Espírito zombeteiro, que busca enganá-lo e ridicularizá-lo. Quando bem orientado, o médium educado compreende que a própria espiritualidade superior possuí meios adequados de promover o encontro entre o Espírito desencarnado e a pessoa que ele deseja se comunicar, seja por meio do desdobramento parcial através do sono fisiológico ou, até mesmo, intuindo o encarnado para comparecer a um centro espírita onde ele poderá receber essa comunicação adequadamente.
Em outra situação, ao esperar o transporte público, o médium começa a sentir uma vontade quase incontrolável de escrever, melhor dizendo, psicografar. Tendo as obras de Kardec como referencial – em especial O Livro dos Médiuns –, saberá que o exercício da psicografia não ocorre dessa maneira, em qualquer lugar, em horários e locais inoportunos. A espiritualidade superior que deseja utilizar a faculdade do médium para a prática da psicografia, recomenda sempre um horário adequado, em local reservado, sempre atentando para a disciplina, a prática da prece e, principalmente, da análise criteriosa do que está sendo escrito ou explanado. (vide questão 43) Os espíritos superiores têm sempre muito trabalho e deveres a realizar e não estão disponíveis a qualquer hora ou ao nosso simples chamado. Apenas os espíritos descompromissados, ainda em estado inferiorizado, atendem a qualquer momento ou se dispõem a perturbar o dia a dia do medianeiro, acordando-o, às vezes, no meio da noite para que ele escreva ou abordando-o no meio da rua ou outros cenários impróprios. O médium que deseja desenvolver a psicografia sabe que para isto existe dia, hora e local adequados, nunca na rua, no trabalho ou despertando de súbito no meio da madrugada.
A caminho do trabalho, o medianeiro encontra um Espírito que deseja se comunicar, seja para uma conversação ordinária ou um pedido de ajuda. O médium versado na literatura e na prática espírita sabe bem que a linguagem utilizada pelos Espíritos é – comumente – a do pensamento, sem necessidade da linguagem articulada para que ambos se entendam. Logo, quando preciso, o médium conversa por meio do pensamento. De modo contrário, pode ser visto como uma pessoa insana, desequilibrada, que conversa sozinha. Portanto, o médium bem instruído sabe que apesar de possuir a habilidade de se relacionar com o plano espiritual, não deve utilizar sua faculdade ordinariamente; sabe ainda que as comunicações em ambientes inapropriados podem abrir precedentes para um processo obsessivo, dificultando o afastamento dessas entidades a posteriori, pois, uma afinidade mais ampla pode ser estabelecida entre o médium e o Espírito que insiste em ser notado.
Durante a realização do evangelho no lar, de forma recorrente, com a família reunida, um Espírito se torna perceptível a visão de um parente ali presente, portador de vidência. Esse mesmo Espírito mostra-se como um guia familiar (um ente querido já desencarnado e amado por muitos), buscando trazer instruções, colaborar com a harmonia da casa, etc. O médium educado e seguro diante das suas faculdades, compreende bem a diferença entre evangelho no lar e reunião mediúnica (vide questão 79). Entende ainda que, salvo raríssimas exceções (uma ou duas vezes durante toda uma existência, a depender de uma série de fatores), pode ser válido a manifestação, mesmo no ambiente do lar, de um Espírito amigo que visa beneficiar a família com alguma instrução. Entretanto, na maioria dos casos, quando um Espírito busca interferir demasiadamente no estudo do evangelho durante o culto do lar, tentando comunicar-se de forma insistente ou exclusiva, a probabilidade dessa entidade ser de ordem inferior, mistificadora ou vingativa, é bastante grande. Cenas como essa – de Espíritos que se passam por outros – são cabíveis de ocorrer até mesmo no interior da própria casa espírita, entre as quatro paredes de uma reunião mediúnica, diante da presença de todo o grupo (que por vezes se deixa levar por nomes elevados e ilustres), quanto mais no recolhimento do lar, com o médium isolado ou afastado de seus companheiros de ideal. Por essas e outras não cansamos de repetir que o discernimento é imprescindível diante do intercâmbio com o mundo espiritual.
O médium espírita – educado e instruído – é discreto, isto é, não faz alarde diante das comunicações ou visões que lhe acomete, muito menos apresenta comportamentos extravagantes, mostrando-se arrepiado, com calafrios, com tonturas, dentre outros desequilíbrios. Se tais fatos ocorrem em seu dia a dia e se isso é realmente derivado de alguma influência externa e/ou espiritual, o médium não chama atenção, permanecendo comedido em suas ações.
Além disso, compreende que não deve repassar determinados recados espirituais adiante ou psicografar no meio da rua, muito menos permitir a psicofonia (incorporação) fora da reunião mediúnica, etc. É preciso educação mediúnica; ponderação diante da diversidade de eventos que lhe reclama a percepção psíquica; bom senso, equilíbrio e discernimento para analisar cada quadro que se apresente convidando-o ao uso correto da mediunidade.
O QUE FAZER?
Como o médium pode proceder ao identificar a presença de um espírito enganador ou vingativo insistindo em atrapalhar o seu psiquismo?
Como assevera a médium Yvonne do Amaral Pereira em Devassando o invisível:
"A prece será sempre a melhor defesa contra essa espécie de habitantes do mundo invisível. Se a prece for feita com a necessária confiança, levando o médium a se harmonizar com as vibrações superiores do Além, geralmente tais entidades se afastam com rapidez, apavoradas e contrafeitas."
Portanto, a prece sincera será sempre a ferramenta mais eficaz diante das investidas da espiritualidade inferior.
Por outro lado, há ainda a manifestação – em ambientes aleatórios – de entidades sofredoras, que não apresentam maldade ou malícia em suas intenções, mas sim, a esperança de serem ajudadas e socorridas, amenizando suas angústias, dores e aflições. Então, o que fazer?
Também nesse caso, a prece será a companheira ideal, o meio de ajuda para com os companheiros necessitados. Como um bom cristão, recolhido no remanso dos seus pensamentos, ao se deparar com tais situações, o medianeiro pode realizar uma rogativa solicitando o auxílio da espiritualidade superior em prol da entidade ali presente. No silêncio da sua prece, também pode (e deve) pedir o auxílio do seu anjo guardião para que lhe ajude e ampare nesse momento, solicitando ainda que as equipes espirituais resgatem a entidade que esteja necessitada de ajuda.
Outra opção similar a essa, de modo direto, tendo a prece sincera como o sustentáculo da sua ação, o próprio médium pode encaminhá-la ao centro espírita no qual faz parte (ou qualquer outro que conheça), usando apenas o seu pensamento e a sua força de vontade. Para isto, em meio à prece, solicitando a ajuda dos bons Espíritos, basta imaginar que a entidade ali presente está sendo levada pela equipe espiritual até o local desejado, envolta em fluidos reconfortantes, de paz, harmonia e tranquilidade...
Por fim, ao término de ambas as atividades, o médium não deve esquecer de agradecer aos amigos espirituais pela ajuda naquele momento. Em seguida, deve prosseguir normalmente o seu caminho e as suas ações rotineiras, compreendendo que esse é apenas um ponto a parte no seu dia, evitando fixar o seu pensamento no que ocorreu ou outros desregramentos emocionais. Uma coisa é ser médium 24h por dia (como destacamos anteriormente), outra coisa é pensar em mediunidade a todo instante, como um pensamento fixo (monoideia).
Importante esclarecer que as duas técnicas acima citadas não ocorrem via psicofonia (incorporação). Ressaltamos que é apenas o pensamento do médium, a sua prece sincera e a sua força de vontade que são utilizados nesse encaminhamento. Dizemos isto, pois dentro das reuniões mediúnicas realizadas nas casas espíritas (local preparado para o amparo aos Espíritos sofredores e obsessores), as entidades em atendimento – via psicofonia – são revestidas pelos fluidos animalizados do médium encarnado (recebendo o choque anímico), melhorando consideravelmente o seu estado vibratório (o que lhe permite ser melhor atendida, logo após, pela equipe espiritual).
Dito isto, ressaltamos que o exercício da psicofonia é amplamente desaconselhado fora das reuniões mediúnicas ocorridas nas casas espíritas. Portanto, é importante que o leitor amigo não confunda essas duas técnicas, isto é, o encaminhamento via pensamento (que pode ser utilizado em qualquer ambiente, sempre de forma amorosa e equilibrada) e o encaminhamento via choque anímico (através da incorporação/psicofonia em uma reunião mediúnica).
Todos esses processos devem ser feitos com muito amor e compaixão, nunca com a pretensão de enxotar os Espíritos – obsessores, sofredores ou quaisquer outros –, querendo se ver livre deles ou qualquer outro motivo que não seja apenas a pretensão de ajudar e socorrer. Mediunidade é amor, é equilíbrio, é estudo, é educação e disciplina, é harmonia, é caridade, é ajuda, é resgate e auxílio, é amparo, é eterno aprendizado, é a extensão da misericórdia divina agindo em prol de toda a humanidade, onde semelhante ajuda semelhante...
Texto extraído do livro Mediunidade com Kardec de Patrick Lima.
Capítulo 4: O Médium e a Casa Espírita
Pergunta 41: Quais são as diretrizes para o exercício da mediunidade fora do centro espírita?
Como citar: LIMA, Patrick. Mediunidade com Kardec. Poverello Edições, 2023. 1ª ed.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. Tradução de Salvador Gentile. 9ª edição. Editora Boa Nova, 2004.
PEREIRA, Yvonne do Amaral. Devassando o invisível. 15ª edição. FEB Editora, 2018.